quinta-feira, novembro 02, 2006

Sem rendição, adesão ou ressentimento!

Há os que perdem e se rendem, desonrados; há os que perdem e aderem, covardes, indignos da causa que defenderam; há os que perdem, reconhecem realisticamente que perderam e se recolhem ao seu território, com humildade e altivez, para a indispensável autocrítica, a necessária reflexão e, principalmente, a sua própria reorganização e reestruturação de idéias e programas.
O PFL não se rende, não adere e, sem ressentimentos, respira e reassume seu papel. Essa é a única atitude digna de partidos que disputam eleições democráticas. Estou propondo que o partido a assuma pública e vigorosamente, já.
Eleições democráticas não constituem nem de longe uma guerra cruenta, que gera luto e ódio. São um torneio de cidadãos que propõem, são ouvidos e, recusados, se preparam para a próxima refrega -daqui a quatro anos-, quando tentarão, de novo, ver aceitas e experimentadas suas ideologias, propostas e programas. Considero que a primeira providência de um partido, contados os votos, deve ser uma declaração de reconhecimento e respeito à decisão popular. Os processos eleitorais em andamento devem, no Estado de Direito em que vivemos, ser decididos pela Justiça Eleitoral, não nos cabendo politizá-los.
O povo decidiu soberanamente -usando um direito que é exclusivamente seu- ao escolher o presidente da República. Sei que essa é uma manifestação desnecessária, mas nunca se deve perder chances de enfatizar que a democracia é o bem civilizatório mais importante conquistado por uma sociedade, e, sem eleições livres e periódicas, não há democracia. A segunda providência deve ser crítica: como se posicionar com relação ao novo governo?
O clima propiciatório sugere a magnanimidade do vencedor. A mão generosa estendida por interlocuções grandiloqüentes pode representar sincera oferta de parceria -quando há afinidades políticas ou ideológicas- ou apenas um golpe enganador, o canto das sereias da "Odisséia".
Nesse momento, a salvação está na lição homérica da resistência preventiva. Tapam-se os ouvidos com a cera da experiência, pois esses convites à aliança visam simplesmente a cooptação; sugerem que haverá partilha do poder, quando apenas procuram abrir caminho para que surjam, com suas malas, Waldomiros, Delúbios e Marcos Valérios.
A rota da oposição só levará a uma futura vitória eleitoral -a única que interessa ao PFL- se a largada for uma precisa definição de objetivos, pontos programáticos bem definidos, cronogramas de ações bem calculados e, principalmente, muita firmeza para isolar, na hora em que se revelarem, os fracos, indignos, trânsfugas, indisciplinados e individualistas, antes que suas traições -no final da jornada- comprometam a longa vigília de trabalho e resistência. E é por aí que devemos começar.
A propaganda -que, sintomaticamente, se convencionou chamar de marketing político, escrachando o que o proselitismo já não argumenta, mimetiza o sistema de "compra e venda"- é um capítulo que a ação oposicionista não deve relegar à condição de providências de última hora.
Nos últimos anos, se abusou dos recursos do Estado e se montou uma indústria de factóides que, a título de divulgar atos administrativos, transformou o Palácio do Planalto numa espécie de comitê eleitoral permanente. O Estado-espetáculo se transformou em Estado circense, com evidente êxito demagógico, como foi possível conferir na campanha eleitoral.
A oposição tem de ser uma usina de sonhos, estimuladora de projetos, uma central de pensamento estratégico que ultrapasse a guerrilha de oportunidades e se constitua, aos olhos do povo brasileiro, não numa alegoria de escola de samba para impressionar na campanha eleitoral e que até vence eleições, como acabamos de ver, mas numa proposta consistente de felicidade, antes que o desenvolvimento, o emprego, a educação e a saúde se tornem utopias inatingíveis, como fatalmente se tornará, dada a irresponsabilidade cruel com que esses temas são considerados.
Os homens de pouca fé transformam as graças em ressaca, mas, para quem tem compromissos democráticos, fim de eleição é apenas um começo de jornada. Foi com esse sentimento que acordei na manhã de 30 de outubro, disparando telefonemas aos companheiros, convocando-os. A democracia não conhece apocalipses, não chegamos ao fim do mundo.
JORGE BORNHAUSEN

O apagão dos aeroportos!

Ainda está viva na memória dos brasileiros a ocorrência do "apagão", quando a incúria das autoridades colocou sob risco o fornecimento de energia elétrica, impondo restrições aos cidadãos e às empresas. A sociedade brasileira sofre agora as conseqüências do caos que se instalou nos aeroportos, em novo espetáculo de fracasso do poder público federal na prestação de serviço sob sua responsabilidade.

Tal qual havia ocorrido em 2001, no apagão da energia elétrica, as autoridades aeronáuticas e aeroportuárias recorrem a explicações e justificativas absolutamente inaceitáveis para ocultar sua omissão. Não podendo atribuir a culpa a São Pedro, como naquela ocasião haviam tentado os responsáveis pelo setor elétrico, as autoridades civis e militares que deveriam zelar pela gestão eficiente da navegação aérea buscam agora escamotear sua negligência com argumentos que ofendem a inteligência do cidadão brasileiro.

Uma dessas autoridades teve o atrevimento de atribuir o "apagão" dos aeroportos, em especial o de Brasília, ao excesso de pousos e decolagens em decorrência das eleições. Feliz seria o Brasil se tantos cidadãos possuíssem aviões a ponto de congestionar os céus por ocasião dos pleitos eleitorais. Esqueceu-se, porém, ao inventar tal disparate, que algumas semanas atrás vivemos uma eleição de primeiro turno sem que nada de anormal ocorresse nos aeroportos do País.

Um outro veio em seguida dizer que o Aeroporto Juscelino Kubitschek, em Brasília, havia subitamente chegado ao limite de saturação. Tivesse consultado a página da própria Infraero na Internet e teria evitado a gafe. De janeiro até o final de setembro de 2006, o movimento de aeronaves na capital federal havia somado 93.250 pousos e decolagens, contra um total de 97.872 operações realizadas no mesmo período de 2005. O movimento diminuiu, portanto. E não se pode esquecer que uma segunda pista havia sido há poucos meses inaugurada no aeroporto brasiliense, o que permite supor uma melhoria em suas condições operacionais.

O que as autoridades teimam em negar, é o que todos já perceberam. Os controladores de vôo, civis e militares, estão realizando uma ação coletiva e deliberada de retardamento dos pousos e decolagens. Chame-se a isto operação tartaruga, procedimento padrão, greve branca, ou que outro nome se deseje inventar: é incontestável que os vôos estão sofrendo atrasos sistemáticos em razão de alteração das rotinas até então adotadas, sem que houvesse qualquer ordem superior para tal. Vá lá que o Comando da Aeronáutica prefira não enxergar tal atitude como indisciplina, para evitar o incômodo da apuração de responsabilidades e da aplicação de punições. Não se pode pretender, porém, que os usuários dos aeroportos, já suficientemente incomodados pelos atrasos de seus vôos, sejam compelidos a aceitar explicações tão destituídas de fundamento.

Muitos devem estar, com toda razão, condenando a categoria dos controladores de vôo pelo aproveitamento político da comoção pública subseqüente ao acidente com o jato da Gol. No entanto, é inegável que o salário de um controlador de vôo é ínfimo perante a responsabilidade colocada em suas mãos. A falta de sensibilidade revelada pela categoria não isenta seus superiores hierárquicos, a quem competia agir para remediar-lhes o salário iníquo.

Irregularidades no cumprimento de escalas de trabalho e respectivos períodos de descanso também devem ser atribuídas às autoridades aeronáuticas. Se o cumprimento estrito das normas exigia a ampliação do contingente de controladores de vôo, por que não foram tomadas as providências necessárias para tal?

O colapso do controle de nosso espaço aéreo não resulta de fatores imponderáveis, ou de um excesso de tráfego aéreo contra o qual seja impossível reagir. Se assim fosse, os cidadãos americanos, europeus e asiáticos já viriam experimentando há décadas o tumulto que ora assola nossos aeroportos. Qualquer um dos quatro mais movimentados aeroportos americanos (Atlanta, Chicago, Los Angeles e Dallas-Fort Worth) suporta sozinho mais pousos e decolagens anuais do que a soma de nossos quatro aeroportos de maior movimento (Congonhas, Guarulhos, Brasília e Galeão). É evidente que, para tanto, dispõem de recursos materiais e humanos muito superiores aos nossos. Cabe, porém, àquelas mesmas autoridades prever a expansão do tráfego aéreo e tomar as providências para enfrentar tal crescimento. Se não o fizeram a tempo, falharam em sua missão.

Não há mistério no que está ocorrendo. Falhou o governo agora, assim como falhou o governo anterior ao não agir para evitar a crise do setor elétrico. O "apagão" dos aeroportos, assim como o "apagão" do setor elétrico, poderia ter sido evitado.

Flávio Freitas Faria é engenheiro formado pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica e consultor legislativo da Câmara dos Deputados

Em feitio de retaliação!

Pressupostos básicos para o sucesso da intenção manifesta pelo presidente Luiz Inácio da Silva de, no segundo mandato, estabelecer relações mais civilizadas e transparentes com a imprensa, vale dizer, de elevar seu nível de interlocução com a sociedade: respeito ao contraditório, tolerância às críticas, convivência com a divergência e, sobretudo, compreensão de que dar entrevistas não é concessão, é cumprimento de um dever a ser exercido em momentos favoráveis e desfavoráveis - principalmente nestes -, sob o critério da liberdade irrestrita de questionar e da disposição de responder sem tergiversar.

As primeiras 48 horas após a vitória de domingo não foram exatamente auspiciosas no tocante à realização da proposta presidencial. Se mudança houve neste curtíssimo período, foi para bem pior.

Em dois dias tivemos a pregação da vingança contra meios de comunicação em ato público de petistas, o convite do presidente do PT e assessor presidencial, Marco Aurélio Garcia, para que os meios de comunicação revejam suas críticas ao governo, a intimidação de profissionais da revista Veja na Polícia Federal, de novo Garcia em ato de grosseria explícita, mandando em entrevistas que jornalistas 'cuidem de suas redações' porque ele não gostou de perguntas sobre o futuro do PT, o ex-ministro Ciro Gomes defendendo concessões de funcionamento e financiamento público a veículos amigáveis e, coroando as ações, a avaliação de presidente da República de que a retaliação não é conveniente, pois transforma a dita imprensa insubordinada em vítima.

Começando pela última dessa série de manifestações absolutamente dissociadas da dinâmica dos regimes democráticos: o presidente não condena as agressões por princípio, mas por tática de atuação política. Na sua visão, não é hábil 'vitimizar' parte da imprensa, mas dele seria de se esperar um apelo ao bom senso endereçado aos seus bolsões mais radicais, tal como fez em relação à economia ao pôr um freio no entusiasmo dos defensores de viravoltas na política que lhe permitiu governar 4 anos e agora se reeleger.

No chamamento à 'auto-reflexão' da imprensa sobre seu comportamento em relação do governo, Marco Aurélio Garcia impõe como 'obrigação' dos meios de comunicação um pedido de desculpas pelo tratamento dado aos escândalos de corrupção porque, segundo ele, o 'jornalismo investigativo' não conseguiu provar nada.

Primeiro, o engano: conseguiu sim, junto com o Congresso, reunir evidências suficientes para que o procurador-geral da República denunciasse à Justiça a existência de uma 'organização criminosa' dentro do governo.

Depois, o equívoco: pedido de desculpas espera-se de quem infringiu as normas do decoro público ou do código penal, não de quem age em consonância ao preceito da liberdade de expressão - legal e legítimo.

No caso da Veja, ainda que possamos creditar a intimidação em depoimento sobre reportagem a respeito da operação abafa da Polícia Federal no episódio do dossiê a um excesso corporativo do delegado Moysés Ferreira, ele só se deu ao desfrute de constranger testemunhas e tratá-las como criminosas porque de alguma forma sentiu-se respaldado para isso. Tanto que o fez depois de confirmada a reeleição de Lula e não antes.

A reação do governo foi meramente formal e a pior atitude ficou com a Federação Nacional dos Jornalistas que, liminarmente, aceitou a versão da polícia. Ressentida pela frustração de ter sido bombardeada em seu intento anterior de formar um conselho para 'controlar, fiscalizar e disciplinar' as atividades da imprensa, a Fenaj agiu como oficial de um departamento de divulgação e informação.

O ex-ministro e deputado eleito Ciro Gomes propõe a criação de uma rede de jornais, revistas e emissoras de rádio e televisão por intermédio das quais o governo possa 'dialogar' com a sociedade da maneira que lhe parece mais conveniente: dizendo só o que quer sem ouvir o que não quer. Isso mediante concessão de verbas públicas - providência evidentemente ligada ao grau de dependência editorial previamente combinado, explícita ou implicitamente.

Lembrou muito as reclamações do PFL contra o então ministro Sérgio Motta pelo fim da prerrogativa do Congresso de distribuir concessões de rádio e televisão por critérios políticos, porque isso tirava do governo um poderoso instrumento de manipulação do Congresso.
Dora Kramer - dora.kramer@grupoestado.com.br

quarta-feira, novembro 01, 2006

Consummatum est ?

A normalidade e a legitimidade da eleição foram violentadas pelo abuso do poder econômico e pelo abuso do poder político.

A crise foi reeleita. O Estado de Direito continua desonrado. A democracia está golpeada. O exercício da soberania popular foi ferido ao se turvejar a consciência do povo, obstruindo-lhe a sua livre manifestação de vontade. A normalidade e a legitimidade da eleição foram violentadas pelo abuso do poder econômico e pelo abuso do poder político. A capacidade de avaliação das massas populares foi corrompida pela divulgação de fatos que se sabe inverídicos e pela divulgação de pesquisas manipuladas influenciando e induzindo o eleitor a uma decisão eivada de vícios, infectada, contaminando o resultado eleitoral. O que parece aos olhos de inocentes um resultado democrático, não passou de um golpe contra a democracia pela prática de crimes e pelo desrespeito ao Estado de Direito, o que vale dizer, desrespeito às leis do País, a exemplo da Lei Complementar nº. 64, de 18.05.1990, art. 19 e parágrafo único, e da Lei nº. 9.100, de 29.09.1995, art. 67, incisos III e IV, cuja conseqüência é a impugnação do eleito através de investigação sumária, processo este que já teve início no Tribunal Superior Eleitoral, e caso seja julgado procedente suspender-se-á a diplomação do eleito, ou proceder-se-á a cassação do diploma caso, à época do julgamento, já tenha sido diplomado. Como já se disse: Fora da lei não há salvação.

Aqui não se deseja nem se está a fazer a apologia do golpe. Golpe é descumprir o Estado de Direito. Golpe é agir como nas eleições da Velha República cujos resultados não tinham nenhuma legitimidade, não representavam a vontade da maioria dos brasileiros, embora os números oficiais mostrassem que sim. A maioria oficializada era uma ficção, um engodo. Tudo era objeto de corrupção. Golpe foi o que se tentou perpetrar contra o povo do Estado do Rio de Janeiro e contra a candidatura do engenheiro Leonel de Moura Brizola em 1982 diante das manobras feitas pela empresa PROCONSULT, contratada da Justiça Eleitoral daquele Estado para a computação da totalização dos votos, tudo com a conivência de institutos de pesquisas e de grandes veículos de comunicação que já estavam corroborando o processo fraudulento através do noticiário e dos números das pesquisas que apontavam a "derrota" daquele candidato que saiu vitorioso nas urnas, embora fosse apresentado como o lanterninha entre todos os candidatos. Golpe, enfim, será a tentativa de desrespeito a instituições como o Tribunal Superior Eleitoral que integra o Poder Judiciário e, como tal, na teoria da tripartição dos poderes, é poder tanto quanto os demais, de quem não se pode subtrair a competência que tem para estabelecer a legitimidade do exercício da soberania popular. Golpe é tentar obstruir a norma esculpida nos parágrafos 10 e 11 do art. 14 da Constituição Federal.

Portanto, erra quem se antecipa em declarações de reconhecimento de vitória ou de derrota quando se sabe que o processo eleitoral se encontra sub judice. Esta é uma questão de direito público, cujas normas lesadas têm caráter cogente e imperativo, natureza que obriga a continuidade do processo até julgamento final, pois a ofensa foi à sociedade, ao Estado e não a interesses privados. O Estado não pode dispor do direito de perseguir o cumprimento das normas que importam na garantia do livre exercício das instituições e, sobretudo da soberania popular. O contrário é golpe, sim! Daí serem desonrosas as declarações de tantos quantos julgarem dispensável a apuração de todos os fatos delituosos verificados nesta campanha eleitoral que induziram ao eleitor tomar uma decisão não condizente com a sua livre vontade e consciência, ferindo de morte o Estado de Direito e contribuindo com a impunidade e as nulidades que campeiam País a fora.
Por isso, não se pode dizer, ainda, com o resultado divulgado ontem à noite que tudo está consumado - consummatum est. A palavra final será do Poder Judiciário a quem compete dizer da lisura do pleito. Assim é em todas as democracias civilizadas que vivem sob a égide do Estado de Direito. É isto o que os cidadãos de bem desejam para o Brasil.
SENADOR ALMEIDA LIMA

terça-feira, outubro 31, 2006

Sem novidades, exceto as piores!

Com a reeleição de Lula, o Brasil continuará sendo governado diretamente das assembléias e grupos de trabalho do Foro de São Paulo, sem a mínima necessidade de consultar o Parlamento ou dar satisfações à opinião pública; o direito da esquerda ao crime e à mentira, já exercido sem maiores restrições, será consagrado como cláusula pétrea da moral política nacional, e os que a infringirem se sentirão pecadores e réprobos; os representantes das Farc e do Mir continuarão circulando livremente pelo território onde vendem drogas e seqüestram brasileiros; os cinqüenta mil homicídios anuais subirão para sessenta ou setenta, mas a liquidação de quadrilhas locais concorrentes da narcoguerrilha colombiana continuará sendo apresentada como vitória esplêndida da lei e da ordem; o MST continuará ditando a política agrária federal; e os empresários que não participem de mensalões ou esquemas similares continuarão sendo criminalizados pela Receita. Até aí, tudo será como antes, exceto do ponto de vista quantitativo, no sentido de que o ruim ficará incalculavelmente pior. As únicas novidades substantivas previsíveis são as seguintes:

(1) Nossas Forças Armadas, que até agora conseguiram adiar um confronto com a realidade, terão de escolher entre continuar definhando ou integrar-se alegremente na preparação de uma guerra continental contra os EUA, ao lado das Farc e sob o comando de Hugo Chávez.

(2) Como Lula promete para o seu segundo mandato a "democratização dos meios de comunicação", os órgãos de mídia que se calaram quanto aos crimes maiores do presidente serão recompensados mediante a oficialização da mordaça. Não deixa de ser um upgrade.

(3) Alguns políticos com veleidades legalistas, que faziam alarde de querer punir os crimes do PT, partirão para o adesismo retroativo e inventarão para isso justificativas sublimes. Tudo o que ficou impune será esquecido ou premiado.

Geraldo Alckmin perdeu porque sacrificou sua candidatura, sua consciência e até sua religião ao voto de silêncio no que diz respeito ao abortismo, ao Foro de São Paulo, às ligações de Lula com as Farc e do PT paulista com o PCC. No último debate, uma insinuação velada – ou ato falho -- mostrou que ele estava bem avisado pelo menos quanto a este último ponto, mas não queria passar a informação aos eleitores. Gastou seus quinze minutos de fama empregando nisso o melhor da sua covardia, e não se pode dizer que se esforçou em vão. Simultaneamente, um artigo meu sobre o Foro de São Paulo era censurado na Zero Hora de Porto Alegre e o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh fazia o que podia para calar o jornal eletrônico Mídia Sem Máscara. No tópico do abortismo, pela primeira vez na história das eleições no mundo um partido proibiu, com sucesso, toda menção pública a um item do seu próprio programa oficial. Os que violaram o voto de censura pagaram pela audácia: o arcebispo do Rio de Janeiro teve sua casa invadida pela polícia e, em Belo Horizonte, dois jovens foram presos por distribuir folhetos sobre o compromisso firmado por Lula no sentido de legalizar o aborto no país. Nunca um partido teve um controle tão completo sobre a lista dos argumentos permitidos e proibidos na propaganda eleitoral. Os últimos dias da campanha deram uma amostra do que o segundo mandato de Lula promete ao Brasil

Olavo de Carvalho - 30/10/2006

sexta-feira, outubro 27, 2006

As batatas!!

SALVO SE as muralhas de Jericó se reerguerem, se o Mar Vermelho voltar a se partir em dois ou se algum outro cataclismo de inspiração sobrenatural desabar sobre a Terra, Lula deverá ser reeleito daqui a três dias. Terá sido uma campanha eleitoral atípica. Morna até as vésperas do primeiro turno, quando o chamado dossiegate irrompeu e obrigou Lula, que já cantava vitória, ao segundo turno. E de novo morna nestas últimas quatro semanas em que o presidente retomou, com folga, nítida vantagem sobre Alckmin.
Fala-se no carisma de Lula, em sua identificação com as camadas populares, para explicar o porquê de sua recandidatura ser impermeável a escândalos e imune à corrupção. Mas essa identificação não ajudou Lula nas três eleições presidenciais que ele perdeu (89, 94 e 98).
O próprio "povo" parecia nutrir, então, preconceito contra um candidato de origem e feitio popular. A base popular do eleitorado certamente mudou de opinião depois de experimentar Collor e FHC. Mas foi o próprio Lula quem mudou muito mais.
Foi somente depois de mudar de discurso, abrandar o tom e aderir à pasteurização publicitária que Lula obteve o respaldo da maioria. O "Lulinha paz e amor" foi a conversão do líder sindical à "cordialidade" brasileira -aquele componente enigmático na formação nacional que explica tanto a ausência de guerras civis como a lentidão homeopática de qualquer mudança. A conversão foi facilitada pela derrocada mundial do ideário de esquerda, mas também pela personalidade em questão.
Lula nunca foi ideológico (é conhecida sua desavença com o irmão comunista). Como todo político bem sucedido, ele é um camaleão pragmático que dança conforme a música. Outra meia-verdade é que Lula tenha sido vítima de preconceito. Foi alvo de preconceito, sim, mas também de discriminação positiva. O que antigamente se chamava de "aparelhos ideológicos do Estado" -universidade, imprensa, igreja, intelectuais, artistas- sempre o viram como messias social, líder puro e autêntico a ser poupado de qualquer cobrança ou crítica.
Foi esse manto de impunidade com que os intelectuais cobriram sua imagem que o tornou presunçoso, irritadiço diante da menor interpelação, mal acostumado a só ouvir bajuladores. O mesmo manto, agora rasgado pelo exercício desabrido do poder, explica que parte dos intelectuais esteja desiludida e outra parte esteja como o avestruz que enfia a cabeça na areia.
Talvez, no futuro, os períodos FHC e Lula sejam vistos como um só -o momento em que a social-democracia brasileira fez o que a matriz havia feito décadas antes: aderir à economia de mercado e praticar transferências de renda como forma de mitigar a miséria e vencer eleições. Ao vencedor, as batatas.
OTAVIO FRIAS FILHO

Servidão voluntária

MILÊNIOS TECEM a fortuna desse oxímoro, indigitando atos vis: covardia do guerreiro, violência do demagogo, malefícios do tirano, blandícia da massa. Na Renascença, essa figura foi evocada em leque, embora incautos a atribuam "pela primeira vez" a La Boétie. Meio século antes, Erasmo recolheu-a no bestiário que satiriza a apologia da ignorância e o malogro do arbítrio. A abelha, irrefletida, próxima à natureza, é insuperável ao construir edifícios e repúblicas. O cavalo, afim ao homem, mimetiza-o e partilha sua inteligência, sentimentos e miséria: na ânsia de vencer, ambos se esfalfam, batalham, forcejam e, por fim, golpeados, comem pó. A ele, mil suplícios: freio, espora, chibata, rédea, toda a tragédia de uma servidão aceita voluntariamente. Existências ínfimas -de mosca, peixe, rã, esponja-, porém livres, são melhores. Quem, dotado de força, discernimento e arte, deixou-se escravizar, anuiu à pior sina.
No crivo do intertexto, a República. Nela, a erosão democrática acentua o corte entre ricos e pobres, põe delinqüentes em cargo público, gera gula política, violência, mentira, demagogia, perjúrio, garrulice, boato, lisonja, soberba e corrupção. Findo o processo, a liberdade converte-se em tirania: a insegurança clama pela figura do protetor do povo, o Um solitário, que, sentindo-se ameaçado, recorre à guarda do corpo, força armada. Nesses regimes, invertem-se os valores: a vergonha é dita loucura, e a prudência, covardia; ordem e comedimento viram rusticidade e avareza; o pródigo torna-se magnânimo, e o covarde, destemido. Aguda ironia distorce o respeito à lei e à autoridade que a garante, transfigurando-o negativamente em servidão voluntária.
De te fabula narratur. Reitores de universidades federais vergam-se ao poder que sucateou suas instituições enquanto, à larga, privatizava a educação via Prouni.
Sindicatos ficam surdos à prometida "flexibilização" dos direitos trabalhistas e ao projeto de reduzir o "rombo" da Previdência. Em meio a simulacros de democracia e crimes políticos, serviços de inteligência se instalam em partidos, propõe-se estatuto de ministério à Polícia Federal. Vicejam tubérculos da ditadura? Intelectuais fogem à crítica: silentes na maré baixa, tagarelam na preamar, absolvendo o ultraje da República. A que aspiram: cargos oficiais, verbas, monopólio nas agências financiadoras?
Tratando-se de trair a fé e o patrimônio públicos, não há desculpa para pessoas cujo ofício é pensar e em cuja prática é ingente a consciência moral.
Como explicar que um país de 180 milhões "pôde ser surpreendido e jogado, sem resistência, na servidão" por alguns cavalheiros das finanças e seu preposto?
MARIA SYLVIA CARVALHO FRANCO

Passado e presente do dr. Greenhalgh!

O deputado Luiz Eduardo Greenhalgh acaba de enviar ao site Mídia Sem Máscara uma notificação extrajudicial na qual, com a autoridade que acha que tem, ordena sejam retirados do ar vários artigos, entre os quais o meu Aids, Brasil e Uganda , em cujo rodapé há algumas referências dolorosamente verídicas à sua empombada e hipersensível pessoa.

Como o artigo foi publicado originariamente no Diário do Comércio de 17 de outubro de 2005, em cujo site continua acessível ao público sem que isto incomode em nada o enfezado notificante, é óbvio que a iniciativa autoritária, voltada seletivamente contra o pequeno jornal eletrônico que apenas reproduziu a matéria, é uma abjeta tentativa de intimidação discriminatória que muito revela sobre o caráter do dr. Greenhalgh.

Para piorar ainda mais as coisas, cada uma das informações transmitidas no artigo é baseada na coluna de Cláudio Humberto e no livro de Adolpho João de Paula Couto, A Face Oculta da Estrela , as quais fontes também continuam à disposição dos leitores sem sofrer qualquer constrangimento da parte do referido.

Essas informações (repito-as para tirar desse censor autoconstituído a ilusão de poder ocultá-las), são as seguintes:

“Em plena legalidade democrática, um ano depois de assinada a Constituição de 1988, o dr. Luiz Eduardo Greenhalgh pregava a revolução pelas armas, o desmanche do Exército, da Marinha e da Aeronáutica e a revisão da Lei de Anistia para transformá-la num instrumento de vingança jurídica contra todos os que cometeram o crime eternamente imprescritível de opor-se ao terrorismo comunista no Brasil... O programa do homenzinho, simples e brutal, abrangia:

- Remanejamento das Forças Armadas, transferindo para o Norte os oficiais que serviam no Sul e vice-versa, para afastá-los das frações por eles comandadas, prevenindo possíveis ações armadas contra os planos revolucionários do futuro governo de esquerda.

- Reformar metade dos oficiais da ativa (ele já tinha a lista dos selecionados).

- Extinguir todos os órgãos de Inteligência e abrir seus arquivos para exame de uma ‘Comissão Popular’.

- Revisão da Lei de Anistia e processo em cima de todos os ex-colaboradores da repressão ao terrorismo.

Para maior claridade do esquema, Greenhalgh concluía: ‘Só através da luta armada é que conseguiremos garantir a realização do plano.’”

Se na sua notificação ele alega agir em defesa da sua “boa fama e reputação profissional”, não creio que a tentativa de apagar à força os rastros de um passado abominável do qual jamais se arrependeu confirme uma coisa ou a outra, principalmente porque em grande parte essa fama e essa reputação advêm do seu sucesso em abafar o inquérito sobre o assassinato do prefeito Celso Daniel, coisa que não é propriamente boa nem aliás profissional.

Ele diz também proteger a sua “honra”. Não precisa e não adianta. Um monumento à sua honorabilidade já se encontra em http://www.youtube.com/watch?v>GPDodHSol0w . É a conversa grampeada dele com o assessor presidencial Gilberto Carvalho, discutindo detalhes da operação-abafa.

Mas todo esse empenho de esconder, camuflar, escamotear e apagar, no qual o dr. Greenhalgh gasta as melhores energias do seu profissionalismo, é perfeitamente vão. Mil vezes o deputado dará sumiço no seu passado e mil vezes ele reaparecerá no presente, já que a diferença entre esses dois momentos é mínima.

Odr. Greenhalgh era e é um adepto fanático e auxiliar fiel do terrorismo revolucionário, tanto quanto qualquer colaborador político da Al-Qaeda, do Hezbollah, das Farc ou do Mir chileno.

Não cito estas duas últimas organizações por acaso. Seus agentes operam no Brasil, vendendo drogas e seqüestrando nossos compatriotas, seguros de que, se forem presos, o dr. Greenhalg tudo fará para libertá-los, como fez com os seqüestradores de Abílio Diniz e de Washington Olivetto e com o falso padre Olivério Medina, aquele mesmo que informou ter trazido cinco milhões de dólares da narcoguerrilha colombiana para a campanha presidencial de Lula em 2002.

O dr. Greenhalgh adquiriu ainda mais fama e reputação quando o deputado Jair Bolsonaro disse que ele sofria de tendinite de tanto contar dinheiro, recebido das indenizações políticas que patrocina.

Não sei se havia nisso alguma verdade, mas duvido que dos seqüestradores estrangeiros ele receba alguma coisa. Ele os ajuda por puro amor à truculência comunista.

Ciente de que o Mídia Sem Máscara nada publicou que não possa provar, recomendei ao site, do qual sou fundador e uma espécie de editor platônico, que ignore solenemente a notificação e mande o presunçoso queixar-se à Justiça, caso seja louco de levar a sério seu próprio blefe.
Olavo de Carvalho
Diário do Comércio em 25/10/2006

sábado, outubro 21, 2006

Sandice? Burrice? Ou crime?

Dependendo da análise jurídica do presidente da República, foi burrice. Pelo menos esta é a conclusão a que chegamos ouvindo suas respostas e seus comentários na entrevista concedida à TV Cultura.

Ele conta que chamou o então coordenador de sua campanha, que foi seu ministro e é presidente nacional do seu partido, o PT, e lhe perguntou de forma direta: 'Ricardo, você sabe quem armou esta burrice?' Mas o ex-ministro, também da turma que não sabe de nada, não sabia de nada!

O presidente não se conformou com o fato. 'Como não saber? Gente sua! Auxiliares seus! Gente do nosso comitê e do comitê do Mercadante!'

Segundo ele mesmo, o presidente teria usado um palavreado bastante forte. Muito gentil com as ilustres jornalistas presentes, porém, poupou-as de repeti-lo... Mas tratou de tomar as providências, com severidade, como, disse ele, sempre fez durante toda a sua vida. 'O companheiro errou? Tem de pagar pelo erro.' (É bem verdade que ninguém foi demitido. Uns foram afastados. Outros pediram demissão. O inquérito que corre foi aberto pelo Ministério Público, diante da ação eficiente da Polícia Federal.)

Na entrevista ficou claro que, apesar da bronca que passou nos aloprados, ele continua achando que os 'companheiros' só foram 'burros'. Ou seja, obviamente eles não foram suficientemente competentes para que o plano desse certo! Isso, sim, foi imperdoável.

Quanto ao pobre do Berzoini, a coisa ainda foi mais deprimente. O presidente da República não admite que ele não soubesse de nada. O presidente da República não aceita essa desculpa. O chefe tem de saber de tudo, pois não? Dentro desse seu raciocínio, a única exceção parece ser o presidente da República. Só a ele cabe não saber de nada.

A chantagem nos Correios, o mensalão, o valerioduto, o superfaturamento na publicidade, os dólares no avião dos pastores do bispo Macedo, os dólares na cueca, os dólares para a compra do dossiê falso, as contas do pagamento de cartilhas, a violação do sigilo bancário do caseiro Francenildo, a prática repetida de rapinagem nas prefeituras petistas, tudo isso escapou à sua vigilância. E, é sempre bom lembrar, se não fosse a briga interna que explodiu entre os aloprados, o Brasil estaria até agora encantado com a 'extraordinária habilidade política' revelada pelo presidente da República ao montar a sua fidelíssima bancada majoritária no Congresso! Que talento! Que demonstração de força persuasiva!

Na entrevista, visivelmente irritado com as perguntas pertinentes dos jornalistas, ele mais uma vez se mostrou incapaz de responder com clareza e exatidão. Tergiversou, rodeou e fez apenas o que sabe fazer: auto-elogios! Mal o entrevistador terminava a sua fala e lá estava o presidente da República repetindo, pela milésima vez, as suas habituais arengas.

Ouvindo-o, e o vendo, um pessoa desavisada imaginaria que, até o início de 2003, o País estava à deriva. Ele diz isso com a maior leviandade. No entanto, todo mundo sabe que, desde 1994, o Brasil vinha lutando e vencendo uma terrível batalha contra a inflação, que culminou com os belos resultados que aí estão até hoje. E tudo isso apesar de o PT e suas lideranças terem sempre trabalhado contra o Plano Real.

Uma pessoa que chegasse agora ao Brasil e ouvisse as declarações do presidente da República iria supor que a modernização dos portos fora obra dele. Imagine! Foram quatro anos de luta atroz contra os sindicatos do atraso. Luta iniciada em 1993 e só terminada em 1997!

Na entrevista, o presidente disse que 'sempre foi parlamentarista'. Chega a ser piada... E mais piada ainda foi ouvi-lo dizer que vai 'lutar pela fidelidade partidária e pelo financiamento público das campanhas'. Pode ser que essa, agora, venha a ser a saída do presidente e do seu PT, depois que o famoso 'processo petista de montar bancada fiel' e 'trocar o caixa 2 pelo mensalão' acabou descoberto e desmoralizado.

Sua posição quanto às privatizações é absolutamente dinossáurica. Nem a esquerda chinesa acredita mais nisso! A sorte do Brasil foi, exatamente, o Estado ter conseguido se libertar dos entulhos monopolistas e autárquicos, herdados de duas ditaduras.

Quem tem boa memória sabe que, até há poucos anos, entre as entidades federais que integravam o patrimônio da União, estavam o bondinho do Corcovado, hotéis falidos em estâncias hidrominerais, empresas de telefonia que não instalavam novas linhas, empresas de navegação cheias de funcionários e sem navios , empresas ferroviárias sem trilhos e sem trens, portos, outrora movimentados, parados e enferrujando ao tempo.

Tudo isso mudou. Graças à retirada do Estado, o patrão dono preguiçoso e incompetente saiu de cena. Hoje, os usuários dos serviços são prioridade. Empresa que não der conta do recado perde a vez e o lugar.

É claro que, para a mentalidade petista, isso é um desastre. Quantas nomeações de companheiros deixarão de ser feitas? É por isso que o presidente acha que a privatização da Vale do Rio Doce foi um erro e que as empresas estatais de telefonia deveriam continuar a infernizar a vida de todos nós.

Nestes próximos dias, certamente teremos novos pronunciamentos do presidente da República. Tivemos o cuidado de não chamá-lo de Lula, neste artigo, porque ele se mostrou ofendido com a sem-cerimônia do seu opositor na eleição. Faz questão das deferências.Tudo bem. Existe, no entanto, uma pergunta que continua no ar e não ofende Sua Excelência: de onde pode ter vindo o dinheiro que foi encontrado em poder dos seus 'meninos', naquela sandice? Ou naquela burrice? Ou naquele crime?

O Berzoini, coitado, não sabe. Mas o chefe dele é obrigado a saber, não é?

Sandra Cavalcanti, professora, jornalista

quinta-feira, outubro 19, 2006

Somos irmãos

Com toda a sinceridade, quando penso no Brasil, penso num irmão maior, num povo alegre que, como o boliviano, quer viver bem

OUVI DIZER que os meios de comunicação brasileiros disseram que a Bolívia teria "humilhado" o Brasil. Pode o povo irmão boliviano humilhar o povo irmão brasileiro? É aceitável que, em pleno século 21, estejamos pensando em termos de "humilhação", de "submetimento" ou de "subordinação" quando os destinos de todos os povos sul-americanos estão indissoluvelmente ligados para derrotar a fome, o esquecimento e o colonialismo externo?
Devo lhes dizer com toda a sinceridade que, quando penso no Brasil, penso em um irmão maior, em um povo alegre e dinâmico que, como o boliviano, quer "viver bem", quer acabar com a pobreza e quer ser dono de seu futuro.
Quando, no dia 1º de maio, decretamos a nacionalização de nossos hidrocarbonetos, o fizemos para recuperar um recurso natural que foi inconstitucionalmente privatizado pelos governos neoliberais. Para a Bolívia, não existe futuro sem a recuperação do controle sobre todos os nossos recursos naturais e as empresas estatais privatizadas. Não queremos fazê-lo de maneira negativa, atropelando ou ofendendo. Por isso, propusemos a renegociação de novos contratos com todas as empresas estrangeiras, para que os ganhos sejam distribuídos de maneira mais justa e eqüitativa.
Não queremos abusar de ninguém, não queremos nos aproveitar de ninguém... só o que nós queremos é um trato justo, para que não sobrem migalhas em nosso país e para que possamos começar a construir um amanhã diferente.
Se cheguei à Presidência de meu país, foi graças à luta de muitos anos de meu povo pela nacionalização de nossos recursos naturais. Por isso, a primeira coisa que fiz no governo foi satisfazer esse anseio, atender a esse clamor. Sei que alguns poderosos se sentiram surpreendidos, contrariados e incomodados. Sinto muito, mas já era de começar a chover para todos.
A nacionalização dos hidrocarbonetos na Bolívia não tem porque provocar incertezas no Brasil. Mesmo nos momentos mais difíceis de nossa história, nós mantivemos nossas exportações de gás ao Brasil, e vamos continuar fazendo o mesmo. As modificações que estamos negociando não têm porque afetar o consumidor brasileiro, já que são extremamente pequenas, levando em conta que a receita da Petrobras em 2005 foi 24 vezes maior que todas as exportações mundiais da Bolívia no mesmo ano.
Em meus oito meses de governo, aprendi que os grandes ricos e os novos conquistadores não dão a cara a tapas para enfrentar o povo. Não! O que fazem é provocar disputas entre pobres, para nos enfraquecer, para nos desunir, para nos distanciar uns dos outros. Por isso, me entristece muito quando procuram distanciar e provocar um confronto entre os povos irmãos da Bolívia e do Brasil.
Eles, os que sempre estiveram em cima, sabem que em nossa união está a força, que, juntos, somos invencíveis. Por isso a insídia, por isso a mentira, por isso a calúnia. Por isso essa retórica que procura nos converter em seres egoístas que pensamos apenas em nós mesmos, em nosso bem-estar individual, nos esquecendo de que compartilhamos um mesmo continente, um mesmo planeta.
A sorte do Brasil é a sorte da Bolívia, da Argentina, do Uruguai, do Paraguai e de todos os países da região. Em nossos tempos, já não podemos pensar unicamente em termos de país. Juntos, precisamos nos apoiar, precisamos colaborar, precisamos nos compreender uns aos outros.
Entre povos irmãos, precisamos compartilhar, e não competir, precisamos nos complementar e fortalecer nossa unidade sul-americana. Essa é nossa agenda para a próxima reunião da Comunidade Sul-Americana de Nações que terá lugar em Cochabamba, Bolívia.
EVO MORALES AYMA é o presidente da Bolívia.

Hipocrisia

UM DITADO ANTIGO diz que a hipocrisia é a homenagem que o vício presta à virtude. O mesmo se pode dizer das campanhas eleitorais.
A cada eleição a sociedade aprende, torna-se mais atenta e menos vulnerável à mera demagogia. No plebiscito de 2005 sobre armas, por exemplo, todos saímos do processo mais esclarecidos do que antes.
Ocorre que as campanhas também evoluem. Não é que os truques para engambelar o eleitorado desapareçam; eles apenas se tornam mais sutis, menos ostensivos. Gostemos ou não, amadurecimento político é isso: sofisticação da hipocrisia eleitoral para ganhar um eleitor escaldado por enganos anteriores.
Paulo Francis costumava dizer que só um político, Hitler, cumpriu exatamente o que prometeu. Políticos "normais", para conseguir se eleger, são obrigados a disfarçar o que pensam, fazer concessões, tentar agradar a gregos e troianos. Assim se formam as maiorias.
Veja o caso do Bolsa Família. O programa tem um valor humanitário inquestionável. Mas do ponto de vista político, o presidente que o extinguir cairá no dia seguinte. Seu interesse será aumentar o programa, que se revelou um instrumento seguro para vencer qualquer eleição.
Em algum momento no futuro remoto, talvez, surgirá no debate político a necessidade de fazer uma "reforma" no Bolsa Família. Então, como hoje, "reforma" será um eufemismo para cortar gastos e reduzir rombos crescentes no Orçamento. Mas nos próximos anos o programa só fará crescer, qualquer que seja o presidente.
Corte de gastos, aliás, é o que terá de ser feito já no próximo governo. Lula e Alckmin sabem disso muito bem. O primeiro, no entanto, nega que vá cortar, ao passo que o segundo contorna o tema espinhoso dizendo que a redução de gastos virá tão somente de uma melhora na gestão dos recursos públicos.


O que parece mais grave no escândalo chamado de dossiegate não é o fato em si. O grave é a desfaçatez que o submundo petista exibiu numa operação tão obviamente arriscada. As razões desse modo de agir são evidentes.
O governo sobreviveu ao escândalo do mensalão, que veio à luz em meados do ano passado. Se Lula tivesse colocado um ponto final nas práticas ilícitas destinadas a favorecê-lo e à sua turma, não teria havido dossiegate.
O próprio evento do dossiegate mostra que, internamente, tudo foi considerado um acidente de trabalho. O recado não foi "parem com isso", mas foi "vamos em frente". Não fosse assim, não teria havido dossiegate.
Estabilidade de preços, transferências de renda, o governo Lula pode ter todos os méritos que lhe são atribuídos. Mas a opinião pública não poderá alegar ignorância quando ficar patente que estamos reelegendo um governo corrupto que fez de práticas mafiosas seu modo de manter-se no poder.
OTAVIO FRIAS FILHO é diretor de Redação da Folha

terça-feira, outubro 17, 2006

A prova cabal da mentira!

por Olavo de Carvalho em 17 de outubro de 2006
Resumo: Será mesmo normal, inócuo e indigno de denúncia, como quer fazer crer o PT, o fato de que tantos chefes de Estado, tantos líderes de partidos, tantos comandantes de guerrilhas tenham reuniões periódicas para discutir assuntos políticos durante mais de uma década e meia sem que ninguém fora do círculo dos eleitos fique sabendo de nada?
© 2006 MidiaSemMascara.org

Sob o título "Paranóia", encontro no site oficial da campanha lulista (http://www.lulapresidente.org.br/boletim.php?codigo>21) uma declaração sobre o Foro de São Paulo que deve ser analisada com a maior atenção e rigor, porque fornece a prova cabal de que o PT é um partido de sociopatas cínicos, amorais, sem escrúpulos, mentirosos até à alucinação.

Publicado sem assinatura de autor, portanto endossado pelos chefes mesmos da campanha presidencial de Lula, o documento começa anunciando que "alguns artigos na imprensa e muitas mensagens na internet divulgam uma 'denúncia' seríssima: a de que o PT seria integrante de uma perigosa organização internacional chamada Foro de São Paulo" .

As aspas na palavra "denúncia" dão a entender que ela não é uma denúncia de maneira alguma, não é a revelação de ações graves e malignas, mas sim apenas uma tentativa artificiosa de fazer onda em torno de fatos já amplamente conhecidos ou inócuos. Veremos adiante se esses fatos são realmente assim.

"Pois bem: a tal organização existe, chama-se mesmo Foro de São Paulo mas só oferece perigo para os partidos neoliberais".

Como não faz nenhum sentido reconhecer publicamente a existência de algo que já é publicamente reconhecido como existente, este parágrafo é uma confissão de que o Foro de São Paulo, a mais vasta e poderosa organização política já existente na América Latina, fundada por duas celebridades mundiais (Lula e Fidel Castro) e composta por todos os líderes da esquerda continental, continua desconhecido do público geral após dezesseis anos de atividade.

Mas será normal, inócuo e indigno de denúncia o fato de que tantos chefes de Estado, tantos líderes de partidos, tantos comandantes de guerrilhas tenham reuniões periódicas para discutir assuntos políticos durante mais de uma década e meia sem que ninguém fora do círculo dos eleitos fique sabendo de nada?

Ou, ao contrário, a denúncia não tem nada de artificioso, é a revelação jornalística obrigatória de um fato importante e colocá-la entre aspas é que é uma tentativa pueril de esconder um elefante por baixo de um pires?

Raciocinem um pouco. Mesmo que aqueles indivíduos se reunissem sem qualquer intuito político, mesmo que fossem ali apenas para beber cerveja e jogar futebol-de-botão, o número e a magnitude deles já faria do acontecimento um alvo necessário e indispensável de atenção jornalística. O silêncio total da mídia a respeito assinalaria, no mínimo, uma falha profissional imperdoável, mesmo que o encontro se realizasse uma única vez. A persistência da omissão por dezesseis anos seguidos, mesmo se não levarmos em conta suas implicações políticas e a considerarmos apenas do ponto de vista técnico-jornalístico, já seria por si um fenômeno alarmante no mais alto grau. Ainda supondo-se que não houvesse nisso nenhum esforço de ocultação, apenas um lapso de atenção profissional, é evidente que uma gigantesca falha de cobertura, repetida uniformemente por todos os jornais, canais de TV e noticiários de rádio ao longo de tanto tempo, comprovaria uma epidemia geral de inépcia jornalística como nunca se viu na história da mídia mundial. Dizer que isso não constitui motivo de denúncia ultrapassa a margem do que se pode conceder à hipótese da estupidez. É cinismo puro e simples. É mentira consciente, produzida no intuito de ludibriar os votantes às vésperas de uma eleição.

Mas quem, em sã consciência, pode acreditar numa tão vasta, geral e duradoura conjunção de inépcias jornalísticas acumuladas em todas as redações, em todas as cabeças de jornalistas do país ao longo de dezesseis anos por mero acaso, por pura coincidência? Se essa coincidência tivesse realmente acontecido, sua improbabilidade matemática seria tão gigantesca que, por si, o fenômeno mereceria estudo científico. Querer que acreditemos nisso é esperar que abdiquemos totalmente da inteligência racional e do senso das proporções, para apostar na palavra sacrossanta de um redator de aluguel a serviço de um partido de ladrões.

Para qualquer observador com QI superior a 12, é claro que houve ocultação deliberada do Foro de São Paulo e, uma vez vazado o segredo, um esforço proposital de abafar o escândalo por meio de evasivas, desconversas e novas ocultações. Essas duas etapas da fraude se evidenciaram, respectivamente, no sumiço completo do site do Foro de São Paulo logo após eu começar a divulgar trechos das atas de suas assembléias, e na nota oficial do PT, assinada por seu assessor de imprensa Giancarlo Summa, que afirmava ser o Foro apenas um inofensivo centro de debates, sem intuito decisório, afirmativa que desmenti, com provas cabais, em artigo publicado em O Globo em 19 de outubro de 2002 (http://www.olavodecarvalho.org/semana/10192002globo.htm).

Não sei como o acordo de sumir com a notícia veio a ser obedecido tão fielmente por todos os órgãos de mídia (se bem que no Brasil eles não sejam tantos que não se possa suborná-los, ou intimidá-los, ou simplesmente seduzi-los por atacado). Mas sei de onde partiu a ordem de sumiço: partiu do próprio Foro de São Paulo, na pessoa do seu fundador e dirigente máximo, Luís Inácio Lula da Silva. Quem me contou isso? Foi ele mesmo, ora bolas! Ele próprio, no seu discurso de 2 de julho de 2005, comemorativo dos quinze anos de fundação do Foro, declarou que essa entidade era um sistema de relações construído entre ele e outros líderes esquerdistas "para que pudéssemos conversar sem que parecesse e sem que as pessoas entendessem qualquer interferência política". Pergunto ao autor do documento: Você não sabe ler, desgraçado? Não entende o que o seu próprio chefe admite com clareza máxima? Entende sim, e porque entende, esconde. No caso, esconder se torna ainda mais fácil porque o discurso com a confissão explícita da ocultação proposital também foi ocultado por sua vez: publicado no site oficial do governo (http://www.info.planalto.gov.br/download/discursos/pr812a.doc, não foi citado por nenhum jornal, revista, canal de TV ou estação de rádio deste país, mesmo depois que o denunciei nas minhas colunas, aqui, no Jornal do Brasil e no Mídia Sem Máscara. Vai me dizer, moleque idiota, que isso também foi coincidência, mera coincidência?

A segunda frase do parágrafo admite que o Foro é perigoso, "mas só para os partidos neoliberais". Não interessa, no momento, discutir o sentido objetivo do termo "neoliberal", que já investiguei em artigo anterior (http:// www.olavodecarvalho.org/semana/050725dc.htm). Interessa que, para os esquerdistas em geral, incluindo o autor do documento, o termo designa pessoas e entidades que eles parecem não ter a menor dificuldade de identificar, tal o sentimento de certeza com que o aplicam a esses alvos. As duas perguntas que a afirmação suscita são, portanto: (a) Que tipo de perigo, concretamente falando, o Foro apresenta para os partidos que tenham a infelicidade de enquadrar-se na classificação de "neoliberais"?; (b) É realmente só esse o grupo ameaçado, ou os perigos aludidos se estendem também a outros grupos não mencionados?

Com relação ao item "a", o autor nada esclarece. Como o documento se constitui de palavras escritas em defesa das ações do Foro, devemos portanto recorrer a estas para esclarecer o sentido daquelas. O que o Foro tem feito contra os neoliberais mostrará a quais novos perigos o autor do documento promete agora submetê-los. Por outro lado, o Foro não age diretamente, mas através das entidades que cumprem suas resoluções. Ora, as ações que essas entidades têm empreendido contra os chamados "neoliberais" constituem-se, em grande parte, de guerra cultural e combate político. O objetivo com que as empreendem foi declarado explicitamente pelo próprio inventor e mentor do Foro de São Paulo, Fidel Castro: "Erradicar o neoliberalismo" (http://www.pt.org.br/site/secretarias_def/secretarias_int.asp?cod=2255&cod_sis=9&cat=7). Não se trata, portanto, de concorrer com o neoliberalismo nas eleições, alternando-se com ele no poder, democraticamente: trata-se de eliminá-lo, de varrê-lo do círculo das possibilidades socialmente admissíveis. O primeiro perigo que o Foro promete para os partidos inimigos é este: torná-los inviáveis como força política e cultural. A promessa é clara, e exclui in limine a possibilidade do rozídio no poder por via eleitoral, que supõe a existência política e cultural do adversário como força organizada. Pode-se concorrer com esse adversário, é claro, mas só como meio temporário destinado, em última instância, a "erradicá-lo". Nenhum partido ou organização rotulada como "neoliberal" jamais ambicionou "erradicar a esquerda". Limitam-se a tentar vencê-la nas eleições, quando podem, e em seguida aceitá-la como oposição democrática sem perspectiva de extinção. A assimetria é evidente.

Se, porém, "ser erradicado" política e culturalmente já é temível o bastante, expondo milhões de pessoas ao perigo de ficar sem representação política ou meios de autodefesa coletiva, as entidades filiadas ao Foro não se contentam com perigo tão modesto. Entre elas constam organizações armadas como as Farc, o MIR chileno, os Tupamaros, que já enviaram para o beleléu, fisicamente, uma quantidade considerável de "neoliberais". O número exato é de cálculo difícil, mas já passou de algumas dezenas de milhares.

O "perigo" anunciado é portanto bem claro: Neoliberais (seja isto lá o que for), nós vamos matar vocês. Os que sobrarem, nós vamos excluir da política e da vida social decente.

O autor do documento é pérfido o bastante para deixar essa ameaça no ar com a certeza quase infalível de que fala em código, só para os do círculo interno, já que os de fora tomarão automaticamente a palavra "perigo" como mera hipérbole vazia, sem que lhes ocorra interpretar as palavras pelas ações e descobrir a presença explosiva da ameaça velada.

Quanto à pergunta "b", isto é, se o perigo se circunscreve aos grupos neoliberais, não creio que seja possível enquadrar nessa classificação os milhares de jovens e crianças que morrem anualmente de drogas distribuídas pelas Farc no Brasil, na Colômbia, na Venezuela e nos EUA. Também não creio que haja algum neoliberalismo na mente de todas as vítimas de seqüestros realizados pelo MIR chileno, como por exemplo o publicitário Washington Olivetto, que não esconde suas simpatias esquerdistas. Mais rebuscado ainda seria chamar de neoliberais todas as vítimas assassinadas, em fuzilarias a esmo ou em disputas de quadrilhas, por bandidos que a Farc instruiu e treinou em técnicas de guerrilha urbana. Cá entre nós, que o autor do documento não nos ouça, a afirmativa de que o Foro de São Paulo "só oferece perigo para os partidos neoliberais" é um eufemismo pérfido e mentiroso. O Foro de São Paulo oferece perigo para qualquer um que atravesse o seu caminho, não só no sentido de oposição política, mas até no de ficar plantado, por acaso, na direção de onde venha uma bala perdida disparada por qualquer discípulo local das Farc. O Foro de São Paulo oferece perigo para toda a população.

Prossegue o documento: "O Foro de São Paulo, como diz o nome, é um "foro" ou "fórum", que faz reuniões anuais de que participam não apenas partidos latino-americanos, mas também partidos socialistas e progressistas da Europa, África e Ásia."

Agora o fulano quer nos fazer engolir que as Farc são um partido político, não a quadrilha armada que vende cocaína no Brasil através de seu sócio Fernandinho Beira-Mar, atira nos soldados do nosso Exército e treina assassinos para que aterrorizem a população. O MIR chileno é um partido político, não uma quadrilha de seqüestradores armados? Para quem esse sujeito pensa que está escrevendo? Para crianças de sete anos? Para bobocas ludibriáveis ad infinitum ? Se essa óbvia fraude publicitária não é crime eleitoral, eu sou o Lula em pessoa.

A explicação acaciana de que o foro é um foro, "ou fórum", é uma papagaiada incumbida de revender, abreviadamente, a mentira boba inventada pelo sr. Giancarlo Summa, de que a entidade "é um foro de debates, e não uma estrutura de coordenação política internacional", à qual não preciso responder porque já respondi em 2002: "Porca miséria, quem já viu um mero foro de debates emitir 'resoluções' ao fim das assembléias? Resolução é decisão, é diretriz prática, é norma de ação. Uma assembléia que emite resoluções, subscritas unanimemente por organizações de vários países, não pode estar fazendo outra coisa senão coordená-las politicamente. É, aliás, o que afirma a resolução final do I Foro (São Paulo, 4 de julho de 1990), ao expressar seu intuito de 'avanzar propuestas de unidad de acción consensuales". O esforço comum para formular uma "unidade de ação" não pode ser puro debate, sobretudo quando se cristaliza em "resoluções": ele é, no mais pleno sentido do termo, coordenação política."

Mas o mais bonito do documento vem no anúncio do XIII encontro do Foro (San Salvador, janeiro de 2007), quando será discutido, entre outros temas, o "combate ao crime organizado, ao narcotráfico e à militarização". Chega a ser maravilhoso. Que é que os mentores do Mensalão, os maiores narcotraficantes do continente e o único governante latino-americano empenhado em militarizar seu país para a "guerra del pueblo entero" (nos termos dele mesmo) podem sugerir para combate aos três males que eles próprios personificam eminentemente? Não sei, mas eu sugiro aos interessados: prendam todos os participantes do XIII encontro do Foro de São Paulo, e verão o crime organizado, o narcotráfico e a militarização diminuírem consideravelmente na América Latina. Eles próprios é que não vão trancafiar-se a si mesmos, como o Dr. Simão Bacamarte. O psiquiatra de Itaguaí era louco, mas teve a honestidade científica de reconhecer que o era. Libertou a população que ele próprio internara e foi para o hospício em lugar dela. Mutatis mutandis, os homens do Foro são bandidos, mas jamais hão de reconhecer que o são. Vão combater o crime metendo na cadeia quem não é seu cúmplice, reprimir o narcotráfico ampliando a clientela das Farc e eliminar o militarismo alistando todo mundo no exército de Hugo Chávez.

A declaração do PT foi publicada um dia depois de sair no Jornal do Brasil o artigo em que eu sugeria ao candidato Alckmin cobrar do oponente explicações sobre suas atividades no Foro de São Paulo. Ela é um arremedo grotesco de antídoto, preparado às pressas por puro temor de um vexame politicamente catastrófico, a revelação, em pleno debate eleitoral, das ações clandestinas do sr. Luís Inácio Lula da Silva como parceiro e protetor dos maiores criminosos do continente.

Em matéria de confronto polêmico, a denúncia do Foro de São Paulo é um autêntico roto-rooter capaz de trazer à tona crimes e perfídias em comparação com os quais tudo o que se denunciou do PT até hoje é agradinho.

Não sei se o sr. Alckmin terá a coragem de usar o equipamento. Mas sei que a extrusão total da sujeira petista enterrada é inevitável, seja nesta eleição ou depois dela. Entendo o desespero da campanha petista. Mesmo que seja vencedor nesta eleição, Lula um dia sairá do poder pelo esgoto. O PT se acha esperto ao ponto de ser o "Partido Príncipe" sugerido por Antonio Gramsci. Mas terá sido o primeiro Príncipe, na História, que foi presunçoso e tolo o bastante para tentar enganar todo mundo indefinidamente. No fim, como diz a Bíblia, sua loucura será exposta aos olhos de todos. No outro mundo, Maquiavel está chorando e Abraham Lincoln está rindo, porque já conhecem o final da novela.

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Paranóia

Alguns artigos na imprensa e muitas mensagens na internet divulgam uma "denúncia" seríssima: a de que o PT seria integrante de uma perigosa organização internacional chamada Foro de São Paulo.

Pois bem: a tal organização existe, chama-se mesmo Foro de São Paulo mas só oferece perigo para os partidos neoliberais.

Fundado em 1990, o Foro de São Paulo ganhou este nome porque sua primeira reunião, feita a convite do Partido dos Trabalhadores, realizou-se na capital do estado de São Paulo.

O Foro de São Paulo, como diz o nome, é um "foro" ou "fórum", que faz reuniões anuais de que participam não apenas partidos latino-americanos, mas também partidos socialistas e progressistas da Europa, África e Ásia.

A próxima reunião do Foro de São Paulo vai acontecer em janeiro de 2007, na cidade de San Salvador, na América Central. O tema central do XIII Encontro do Foro de São Paulo será "A nova etapa da luta pela integração latino-americana e caribenha".

A previsão é que sejam debatidos os seguintes assuntos: a) propostas alternativas ao neoliberalismo: desenvolvimento econômico, social e democratização política; b) colonialismo, ingerência imperialista e acordos de paz; c) segurança hemisférica: combate ao crime organizado, ao narcotráfico e a militarização; d) relação entre forças políticas, movimentos sociais e governos de esquerda e progressistas da América Latina e do Caribe.

segunda-feira, outubro 16, 2006

O petistamente correto!!!!!

Vamos combinar: Lula e o PT não podem ser criticados por questões éticas, porque pairam acima de qualquer suspeita. Toda cobrança é identificada como uma atitude imprópria, que foge aos parâmetros do politicamente correto. Assim foi entendida a cobrança que Geraldo Alckmin fez a Lula sobre a origem do dinheiro que seria utilizado na Operação Cuiabá, montada por dirigentes petistas. O tucano foi considerado “agressivo” por formadores de opinião que fazem precisamente o jogo do “petistamente correto”. Cobrar ética de Lula e do PT, fazer que sejam coerentes com posições passadas, se tornou uma forma de descontrole emocional, signo de agressividade. Desviar recursos públicos com finalidades privadas e partidárias pode. Formar uma “sofisticada organização criminosa” para tomar de assalto o Estado pode. Cobrar essas “atitudes” não pode!

As discussões sobre o debate e suas repercussões já vêm enviesadas, pois se situam na ótica da recepção dos que, vendo o debate e procurando diminuir o desempenho nitidamente superior de Geraldo Alckmin, visaram a cobri-lo com o manto da “agressividade” e do “autoritarismo”. A operação montada pelo PT foi muito bem executada, lançando os seus pit bulls ao ataque, travestidos com o manto da virgindade ultrajada, respaldados por pseudo-intelectuais que já não têm com a verdade nem a mais remota proximidade.

Alckmin, no debate, mostrou um comportamento diferente do que vinha apresentando até então, revelando-se uma pessoa que sabe cobrar e exercer a autoridade. Não houve nenhuma manifestação de cunho autoritário, salvo sob o modo da recepção por um imaginário social que confunde autoridade com autoritarismo. Talvez, segundo esse imaginário, a omissão de Lula em face de suas próprias responsabilidades nos assuntos relativos à corrupção de seu governo seja vista sob a ótica de uma personalidade não-autoritária. A omissão tornou-se sinônimo de tolerância. Tolerância com o quê? Com o direito alheio ou com a corrupção? Até então, a disputa eleitoral vinha sendo pautada pelo candidato petista, agora surge uma nova agenda. E nesta não cessa de martelar a pergunta: qual é mesmo a origem do dinheiro? Será Lula incapaz de perguntar aos seus “companheiros”?

Lula foi manifestamente acuado e procurou, no debate, voltar a tomar a iniciativa. Pretendia, como durante a campanha do primeiro turno, dar as cartas. Isso ficou particularmente visível nas suas repercussões, pois ministros e líderes petistas passaram a ocupar, orquestradamente, os meios de comunicação, seja com mentiras, seja com comportamentos destemperados, seja com atitudes autoritárias.

As mentiras foram, sobretudo, protagonizadas por Marta Suplicy e pelo próprio Lula, segundo os quais Alckmin iria privatizar o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e a Petrobrás. Marilena Chauí saiu no seu encalço falando de um falso projeto de privatização das universidades. A tática, bem conhecida, foi formulada por Goebbels, de triste memória: repetir tantas vezes uma mentira quanto necessário, de modo que ela passe a ser vista como verdade. E, a propósito das privatizações, essa tática tende a ser eficaz, pois o governo anterior jamais fez uma defesa veemente dos processos de privatizações, como se estes fossem um mal menor, em todo o caso um mal. Não se diz que a privatização da Telebrás tornou possível a todos os cidadãos “deste país”, hoje, ter um telefone celular. Antes, era um objeto de luxo, das elites. Tampouco se fala nos ganhos enormes em produtividade, modernização e competitividade dos setores de siderurgia, mineração e aviação. A opinião pública não foi suficientemente informada (e formada) dos benefícios das privatizações.

Os comportamentos destemperados foram protagonizados por Ciro Gomes. Depois de se ter aliado aos homens da cueca no Ceará, ele vem colocar-se como arauto da moralidade, como se puro fosse. O seu comportamento de oligarca de Sobral lhe serve paradoxalmente para criticar as oligarquias brasileiras. Entretanto, tal comportamento pode apresentar bons efeitos eleitorais por ter como alvo os tucanos, tendo ele sido um membro do PSDB, pelo qual chegou a ser ministro. A tarefa que lhe foi designada é propagar: “São todos iguais, fiquem, portanto, com o homem do povo!”

As atitudes autoritárias estão representadas pelo ministro Tarso Genro, que se apressou a considerar “fascistas” as declarações de Alckmin no debate. “Fascista”, por definição, é todo aquele que ousa criticar o PT. “Fascista” é quem não segue o “petistamente correto”. Tal discurso revela que Lula teria acusado recepção do novo estilo adotado por Alckmin. As declarações do ministro devem ser lidas como um sintoma: o de que os tucanos utilizaram uma estratégia que eles não esperavam. Foram “politicamente incorretos”. Surge, mais uma vez, o viés autoritário do PT, que se esconde sob o véu de uma acusação de autoritarismo ao adversário.

As atitudes autoritárias encontram ainda respaldo em posições do MST e do Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) visando a radicalizar o processo político. Segundo eles, o segundo turno exibiria a “luta de classes” em ação, reavivando a comunhão ideológica com o PT e o PSOL. Esses “movimentos” temem, acima de tudo, a vitória de Alckmin, pois este fecharia as torneiras do seu financiamento oficial e não teria leniência com as invasões. O alvo, agora, é um eleitorado comum a toda a esquerda autoritária, seja ela representada pelo PT, pelo PSOL, pela CUT, pelo MST, pelo MLST, pelo MPA ou pelas Pastorais da Igreja. Eleitoralmente, trata-se de capturar os votos dos partidários de Heloísa Helena e Cristovam Buarque, principalmente da primeira. Sigam o “petistamente correto”, pois o caminho da salvação lhes estará assegurado!

Denis Lerrer Rosenfield - e-mail: denisrosenfield@terra.com.br

domingo, outubro 15, 2006

A sina do escorpião!!!

O que mais impressiona na farra de falcatruas do PT é que ela persiste, apesar dos escândalos

SERIA HILARIANTE , se não fosse constrangedor, ouvir Lula dizer que, no segundo turno, iria travar um debate profundo sobre a ética. E não causa menor constrangimento ouvir Tarso Genro afirmando que a eles, petistas, esse debate "interessa muito". E pode-se imaginar quanto, uma vez que o PT nada tem a esconder ou explicar, nesse terreno. Como se sabe, ninguém do PT se envolveu com o valerioduto, o mensalão, dólar na cueca, contratos fajutos, sanguessugas e, particularmente, com a compra de certo dossiê. A declaração desses dois, desculpem-me, lembra Maluf, sorridente, fazendo o V da vitória, ao sair da delegacia de polícia onde fora indiciado.
Não há que se surpreender com isso. O político cara-de-pau não hesita em negar a mais incontestável das evidências, se ela o compromete e pode lhe tirar votos. Você lê e não acredita no que leu, mas é que ele não está se dirigindo a você e, sim, ao eleitor dele. Sabe muito bem que finge e mente, e que ninguém acreditará no que afirma, exceto o eleitor que vota nele e que só necessita de uma desculpa qualquer para continuar votando. Por isso, Maluf garantiu que a assinatura não era dele, embora a perícia o tivesse comprovado, e Lula garantiu que está louco para discutir problemas éticos, quando se sabe que essa é a última coisa que gostaria de fazer. Mas, ao ler isso, o eleitor petista respira aliviado, certo de que, conforme desejava crer, todas aquelas acusações contra seu líder e seu partido são "calúnias da elite". Faz lembrar Nelson Rodrigues, que recomendava à esposa adúltera: "mesmo que seja surpreendida, nua, na cama com o amante, negue, negue veementemente". É que sempre há a hipótese de que o marido (ou o eleitor), preferindo não saber a verdade, aceite a mentira. Essa é a esperança de Lula e Tarso Genro.
Mas, a par disso, devemos reconhecer que os petistas, particularmente os dois citados, são mestres em simulações, verdadeiros atores e tanto melhores se o gênero é a farsa. Veja o que disse Lula, antes mesmo de iniciada a campanha do segundo turno: "Preferia discutir projetos de governo, mas estou com muita vontade de debater ética e corrupção".
Ou seja, nada aconteceu que atinja moralmente o governo. O PT comprou deputados? Não, é claro que não. Petistas foram surpreendidos com montanhas de cédulas de dólares e reais num quarto de hotel? É claro que não. E as pessoas envolvidas nesse escândalo tinham alguma vinculação com Lula e seu governo?
Evidente que não, gente! Um deles era apenas seu assessor especial; outro, seu churrasqueiro; outro, um dos autores de seu plano de governo; o quarto, diretor do Banco do Brasil e integrante da equipe da campanha para sua reeleição;o quinto, o próprio coordenador da campanha e presidente do PT. Isso, sem falar no transportador do dinheiro, coordenador da campanha de Mercadante.
Como se vê, pessoas totalmente desvinculadas de Lula e do seu partido, tão desvinculadas que só mesmo inimigos desleais e uma imprensa facciosa seriam capazes de levantar as suspeitas que levantaram. Logo, não há o que temer em falar de corrupção durante este segundo turno e, se a oposição cair nessa tolice, vai se ferrar, porque, como se sabe, Lula, que é o maior presidente que já houve no mundo, que criou a Petrobras, a Eletrobrás, o futebol brasileiro e as escolas de samba -isso sem falar no funk e no xaxado- é também o maior campeão de ética de todos os tempos. Desafiá-lo, nesse terreno, é derrota certa.
Agora, falando sério, o que mais impressiona nessa farra petista de falcatruas é que ela persiste, apesar dos escândalos que tem provocado. É verdade que corrupção sempre houve e essa é, com razão, a única prioridade que Lula não reivindica para seu governo. Mas ficava restrita, quase sempre, a fatos pontuais, não esta avalanche com que o governo petista afogou o país. Como observou o governador Aécio Neves, Lula já está governando com seu terceiro time, porque os dois primeiros foram expulsos de campo por corrupção acintosa.
E como se não bastasse, veio o escândalo do dossiê, para espanto geral. E o que são agora os boatos de que Alckmin iria privatizar a Petrobras e o Banco do Brasil, senão a mesma guerra suja? Muita gente se pergunta: eles são aloprados? Não, não são aloprados; são corruptos, são viciados em corrupção.
O debate da Band revelou outro escândalo: o autor da boataria das privatizações é o próprio Lula! É que eles não conseguem conter-se, como o escorpião que pica a jia, mesmo sabendo que vai afundar junto com ela. A corrupção é sua segunda natureza.

FERREIRA GULLAR

quinta-feira, outubro 12, 2006

UM ENTENDIMENTO CANHESTRO DE GOLPISMO
GILBERTO BARBOSA DE FIGUEIREDO (*)

Não faz muito tempo, surgiu o primeiro indício de que alguma coisa ia mal para o lado da tão decantada ética do governo petista. O Sr. Waldomiro Diniz, auxiliar direto do Sr José Dirceu, então Ministro Chefe da Casa Civil, foi mostrado na televisão recebendo propina de um empresário de jogos.

Mais tarde, o povo brasileiro, atônito, tomou conhecimento de um esquema sórdido, onde parlamentares eram comprados pelo Governo para compor maioria na Câmara dos Deputados. O caso veio a público através da denúncia de um deputado que teve um seu protegido flagrado pelas câmeras de uma emissora de TV, no exato instante em que aceitava suborno. No momento em que não se sentiu amparado por aqueles com quem contava, detonou a rumorosa denúncia do “mensalão”, com receio, certamente, de ter de pagar sozinho, entre os parlamentares, pelo ato de seu apaniguado.

Como conseqüência da denúncia, caíram diversas personalidades, intimamente ligadas ao Presidente e a seu partido: o Ministro José Dirceu, o Presidente do PT, José Genoíno; o tesoureiro do partido, Delúbio Soares; o dirigente partidário Sílvio Pereira, que ganhou notoriedade pelo Land Rover, recebido como presente de um empresário.

Não foi necessário se esperar muito tempo para que outro escândalo viesse a assombrar a opinião pública brasileira. Agora, era a quebra do sigilo bancário do caseiro de uma mansão do Lago Sul brasiliense, conhecida como República de Ribeirão Preto. Desta feita o Ministro Antônio Palocci, e o presidente da Caixa Econômica Federal, Jorge Mattoso, foram os compelidos a deixar seus cargos.

Todos esses fatos ocorreram com pessoas que compunham o círculo de auxiliares próximos e amigos do Presidente. As maracutaias, para usar expressão muito de seu agrado, foram urdidas dentro do Palácio. E o que é absolutamente espantoso: o Presidente alegava, candidamente, que nada sabia.

Merece registro, no caso, a iniciativa do Procurador-Geral da República, que ofereceu denúncia contra quarenta das mais altas personalidades do Governo por formação de quadrilha, chamando o partido do Presidente de “sofisticada organização criminosa”.

Seguiu-se o caso, pouco comentado pela mídia, da distribuição ao PT de cartilhas da Secretaria de Comunicação da Presidência que, em si, já se constitui em evidente situação de abuso do poder político.

Nas vésperas do primeiro turno das eleições, surge novo escândalo, aquilo que, em nota conjunta, os presidentes dos clubes militares definiram como: “Uma tentativa de comprometimento de dois candidatos a cargos executivos com o caso da compra das ambulâncias, mediante a negociação fraudulenta de um suposto dossiê. Chantagem ou denúncia, mas com a evidente intenção de desqualificar concorrentes eleitorais. Novamente, envolvendo assessor do Presidente, pessoas importantes na hierarquia de seu Partido e dinheiro de procedência duvidosa”.

Nesse episódio constatamos a participação de figuras como: Freud Godoy, pessoa ligada ao Presidente desde de 1980; Jorge Lorenzetti, churrasqueiro de Lula e protetor de gente de sua família; Oswaldo Bargas, marido da secretária particular do Presidente e o próprio Berzoini, presidente do PT, o segundo a ser afastado do cargo, envolvido em suspeitas de atos ilícitos. E o Presidente, novamente, de nada sabia. Nega sua participação na tramóia, afirma querer discutir profundamente o problema da ética, mas ainda não foi capaz de esclarecer de onde surgiu todo esse dinheiro – o equivalente a 1,7 milhões de reais.

A campanha eleitoral pelo primeiro turno entra em sua fase decisiva e, ante a montanha de corrupção mal explicada, a população é surpreendida por outro fato inusitado. Desta feita, a desfaçatez chegou a tal ponto que até aplausos foram roubados.

Em presença de fatos de tal gravidade, políticos da oposição argüiram a impugnação moral e a impugnação jurídica do presidente-candidato. Esta última tem respaldo no Art 67, inciso IV, da lei 9100/95 que preceitua ser crime eleitoral divulgar fatos que se sabe inverídicos, distorcer informações sobre partido ou candidato de forma a influir na vontade do eleitor, sendo o delito agravado quando cometido por meio da imprensa. Por outro lado, a Lei Complementar nº 64/90 estabelece no Art 22 que qualquer partido político, coligação, candidato ou Ministério Público poderá representar à Justiça Eleitoral, solicitando investigação, para apurar abuso de poder econômico ou de autoridade, ou uso indevido de meios de comunicação social em benefício de candidato ou partido político; os incisos XIV e XV, do mesmo artigo, tratam dos procedimentos a serem adotados pelo Tribunal, se for julgada procedente a representação, mesmo quando o julgamento se der após a eleição. A lei parece bem clara, tanto que o TSE resolveu examinar o escândalo do dossiê, onde está sob suspeita a própria candidatura Lula.

Simpatizantes do atual governo, em face da embrulhada jurídica em que se meteu seu candidato, começaram a tachar de golpistas a todos quanto o acusam de haver transgredido a lei e, principalmente, àqueles que alegam haver razões jurídicas para a impugnação. Se houve ou não crime eleitoral, cabe ao TSE e somente ao TSE decidir. Agora, acusar de golpista a quem advoga o cumprimento da lei também já passa dos limites.

O entendimento universal de golpismo orienta-se justamente em sentido oposto. Golpistas são, pois, os que, mesmo antes de conhecer a decisão de um Tribunal, se preparam para pregar o descumprimento de sua sentença, desde que não seja do agrado de sua corrente política. Golpistas, com certeza, são aqueles que pretendem intimidar toda uma nação com a ameaça do emprego dos “movimentos sociais” e da violência anárquica que habitualmente acompanha suas ações, para fazer valer, a qualquer custo, suas anacrônicas idéias.

(*) O autor é General-de-Exército e Presidente do Clube Militar

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Lula e o bolo solado

De um endereço na internet (quotation@logosquotes.org) recebo diariamente uma citação. Na terça-feira veio uma de Bismarck (1815-1898), muito adequada ao Brasil do momento. Disse ele: 'Nunca se mente tanto como antes das eleições, durante a guerra e depois da caça.'

Hoje, felizmente, as eleições se tornaram mais comuns e a caça é muito menos praticada que naquela época. Caçadores perderam espaço para pescadores como mentirosos contumazes na descrição exagerada de seus feitos. Coisas do tipo: 'Pesquei um surubim tão grande que foi necessário um cavalo para arrastá-lo.'

Infelizmente, as guerras continuam, ainda que em escala contida desde a 2ª Guerra Mundial. Já as mentiras eleitoreiras proliferaram com a ética escassa e com a ajuda do enorme desenvolvimento dos meios de comunicação. Mas não se comparam às dos pescadores. São maiores e enganam mais, pois levadas sobretudo àqueles sem condições de discernir entre a versão e o fato. Com essas características, tampouco fazem sorrir; são mais para lamentar.

Numa eleição para escolher a maior enganação eleitoreira deste ano, meu voto iria para a insistência do presidente-candidato Lula em afirmar que a economia vai bem. No estilo 'neste país', essa afirmação vem também na versão de que nunca o Brasil cresceu tanto no passado, ficando o alcance deste limitado conforme as conveniências e o embalo do momento em que a história é repetida. No recente debate com Alckmin na Rede Bandeirantes, conforme transcrição da Folha de S.Paulo, Lula afirmou: 'Nós fizemos o país crescer como em nenhum momento de sua história nos últimos 20 anos.' Não se sabe como e onde ele pescou isso, e o próprio jornal desmentiu com dados a afirmação.

Ainda em setembro, ele concedeu uma entrevista ao jornalista Heródoto Barbeiro, da Rádio CBN, quando, voltando a cinco séculos atrás, aumentou o tamanho do peixe e afirmou que 'o momento é o mais positivo na história econômica do Brasil'. Ao contrário, nosso país mostra hoje um dos piores desempenhos do período coberto por dados do seu produto interno bruto (PIB). Tenho à minha frente um gráfico com esses dados desde 1916, e o que se vê é uma série em média móvel de dez anos com uma tendência que no seu início tem taxas próximas de 2,5% ao ano, e alcança cerca de 9% no final dos anos 70. Na década seguinte despenca para as medíocres taxas perto de 2% que marcam a história do País desde então, mediocridade essa que o nosso presidente insiste em refutar com suas bravatas.

Além disso, na sua peculiar forma de dirigir o País, mais parece um motorista que, em lugar de olhar à frente, se fixa no espelho retrovisor, tamanha a sua obsessão em comparar-se a seu antecessor, FHC. Nisso recorre até à primeira-dama, Marisa Letícia, que ontem este jornal mostrava em campanha de rua a distribuir um cartaz intitulado 'Lula fez mais em 4 anos de governo do que os tucanos em 8'. Ao seu lado, a vice-primeira-dama, Mariza Gomes, levava outro cartaz que dizia 'Lula vence o debate na Band'. Sou suspeito para dizer o contrário, mas na melhor (para ele) das hipóteses o debate terminou empatado, segundo a pesquisa Datafolha divulgada ontem, com 43% x 41% pró-Alckmin, com a conclusão de empate alcançada só no limite da margem de erro (2%).

Voltando à equação 'em 4 mais que em 8', e vendo o exercício da Presidência no seu uso de recursos, o trabalho é o de arrecadar tributos e gastar dinheiro nas várias atividades do governo, como pagar a servidores, realizar investimentos em infra-estrutura e prover serviços como os de educação, saúde, segurança, previdência e assistência social.

Nessas condições, nem os recursos nem os gastos cresceram tanto nos últimos quatro anos a ponto de esse placar ser sustentável. Mas o que faz o candidato em sua campanha? Seleciona alguns resultados de sua conveniência, como a expansão do Bolsa-Família, e apresenta tudo como sua obra exclusiva, esquecendo-se, por exemplo, de que esse programa foi iniciado com outro nome e já havia avançado bastante na gestão anterior.

É claro que Lula fez suas próprias escolhas entre gastar mais aqui ou ali, mas isso implicou gastar relativamente menos acolá. Neste caso, um aspecto que se destaca na gestão Lula, e que prejudicou o crescimento da economia, é a ausência de prioridade também para os investimentos em obras públicas, para ampliar a capacidade produtiva do País e permitir que crescesse a taxas, de fato, meritórias. Contemplando outro gráfico, vejo que desde 1970 e como proporção do PIB nunca 'neste país' os investimentos da administração pública foram tão baixos como no ano passado, muito embora outro gráfico diga que desde o início desse período a carga tributária cresceu 56%.

No debate sobre distribuição de renda no Brasil, a discussão gira em torno de crescer a economia e/ou distribuir melhor o que produz. Diante daquela conversa antiga de que era preciso primeiro crescer o bolo econômico para depois distribuí-lo também aos mais pobres, Lula partiu para fazer essa distribuição rapidamente, com o equívoco de exagerar nessa direção, ao extenuar a economia com mais impostos e sacrificar investimentos públicos de que ela tanto carece.

Também defendo a distribuição de renda, sem adiá-la para depois de o bolo crescer, mas com um equilíbrio entre uma coisa e outra, que Lula não buscou. Assim, além de dirigir o País olhando pelo retrovisor, segue um rumo equivocado e permanece sem condições de dar maior velocidade à economia.

No trajeto, o bolo que distribui não assou normalmente, mas, sim, permanece solado ou abatumado pela falta de investimentos e do fermento econômico que os acompanha.
Roberto Macedo

domingo, outubro 08, 2006

"USP é templo de vigarice", diz Olavo

Reunião de textos do jornalista, filósofo e polemista Olavo de Carvalho, "O Imbecil Coletivo" está sendo relançado. É o primeiro de um conjunto de três volumes que o autor pretende editar. O livro, que completa dez anos, ataca o pensamento de esquerda que seria hegemônico no meio cultural do país e, sem torneios, sustenta argumentos conservadores ou de direita. Desde 2005, Olavo mora nos EUA, em Richmond, perto de Washington. Nesta entrevista, feita por e-mail, ele dispara contra intelectuais da USP, considera que os tucanos são responsáveis pela ascensão do petismo e diz que também existe um imbecil coletivo direitista.


FOLHA - Como o sr. avalia o discurso de alguns intelectuais históricos do PT, como a filósofa Marilena Chaui, que procura relativizar a questão ética na política? O mesmo tema, de certa forma, havia sido proposto pelo filósofo tucano José Arthur Giannotti.
OLAVO DE CARVALHO -
Quando essa gangue uspiana começou a "campanha pela ética na política", uma década e meia atrás, já anunciei que era tudo uma empulhação destinada a entregar o poder total à esquerda, usando e prostituindo a indignação moral do povo com os miúdos corruptos da época para encobrir a montagem da maior máquina de corrupção de todos os tempos.
Os tucanos estão hoje com choradeira, mas eles são amplamente culpados pela ascensão do petismo, do qual foram cúmplices na "estratégia das tesouras" calculada para suprimir da política todas as demais correntes e dividir o bolo entre os dois partidos nascidos da USP. O que quer que venha da boca de Chauis e Giannottis é sempre camuflagem, pose, hipocrisia. Essa gente já deveria estar embalsamada faz muito tempo em alguma espécie de IML intelectual. Cansei de ouvir besteira. "Intelectual de esquerda", seja tucano, petista ou qualquer outra porcaria, tem para mim a confiabilidade de uma nota de R$ 32.
A USP sempre foi o templo da vigarice intelectual, e o sujeito que começa com safadeza no campo das idéias acaba sempre inventando algum mensalão para se remunerar do esforço de embrulhar a platéia. Os tucanos ainda podem se redimir do mal que fizeram. A carta de 7 de setembro do ex-presidente Fernando Henrique é um bom começo, mas é preciso um arrependimento mais fundo e uma tomada de posição mais clara.
Não adianta querer um "choque de capitalismo" quando ao mesmo tempo se cortejam "movimentos sociais" cujos programas "politicamente corretos" exigem sempre maior controle estatal da sociedade. Um capitalismo assim acaba virando capitalismo chinês.

FOLHA - O governo Lula é de direita ou de esquerda? Quais são no seu entender os traços que distinguem, hoje, esquerda e direita?
CARVALHO -
Esquerda é toda corrente que legitima suas pretensões ambiciosas em nome de um futuro hipotético. Direita é quem legitima promessas modestas com base na experiência passada. No Brasil, só quem tem alguma experiência bem-sucedida para ensinar são os remanescentes do governo Médici que fizeram o país crescer 15% ao ano. Estão todos nonagenários ou irrevogavelmente falecidos. Como ninguém absorveu sua lição, não há mais direita no Brasil. Há apenas diferentes graus de esquerdismo, desde o histerismo fanfarrão do PSOL até as afetações oportunistas de políticos ideologicamente inócuos que acham bonito posar de politicamente corretos, como esse ridículo governador de São Paulo. Direita, conservadorismo genuíno, é a síntese inseparável dos seguintes elementos: liberdade de mercado, valores judaico-cristãos, cultura clássica, democracia parlamentar e império das leis. O resto é comunismo, fascismo, nazismo, anarquismo, tecnocracia, "socialismo light", o museu inteiro do besteirol político.
No Brasil, quem ainda tem fibra para ser conservador está fora da política, seja por falta de vocação, seja por uma questão de higiene. O Brasil ainda tem alguns bons líderes empresariais e estudiosos de campos diversos, e acho um sacrifício admirável, mas inútil, que homens bons larguem suas ocupações produtivas para arriscar a sorte numa política eleitoral que virou uma disputa interna no galinheiro esquerdista -cada galinha, é claro, chamando as outras daquilo que no seu entender é a pior das ofensas: "Direitistas!"

FOLHA - O pensamento de direita ganha fôlego no mundo contemporâneo. Nesse contexto, podemos falar na emergência de um imbecil coletivo de direita?
CARVALHO -
Sem a menor sombra de dúvida. O triunfalismo capitalista subseqüente à queda da URSS produziu bibliotecas inteiras de utopismo tecnocrático-financeiro globalista que o 11 de Setembro reduziu a pó, mas do qual muitos cérebros de fantasmas ainda se alimentam nos EUA. A marca inconfundível do imbecil coletivo direitista é a negação de que existam direita e esquerda. O típico doutrinário dessa corrente se coloca numa torre de marfim supra-ideológica, de onde acredita que pode resolver tudo na base da grana. A impotência sempre gera o delírio de onipotência. Praticamente toda a política externa americana da última década e meia se baseou nessa estupidez, e o resultado dela é a proliferação de tipinhos como Lula, Chávez, Morales e "tutti quanti".

FOLHA - Como o sr. avalia a declaração do papa sobre o Islã e as reações contrárias? O sr. crê em algo como "choque de civilizações?"
CARVALHO -
Dizem que há um conflito entre o Islã e o Ocidente. Mas qual Ocidente? O Ocidente religioso, judaico-cristão, ou o Ocidente revolucionário, ateu, materialista? Este último está obviamente do lado dos terroristas, e é ele mesmo quem alardeia o slogan do "conflito de civilizações" para camuflar a guerra de vida e morte que, por meios diversos e aparentemente inconexos, se move contra os judeus e os cristãos no Islã, nos países comunistas e no próprio Ocidente capitalista.
O número de cristãos inocentes e desarmados que vêm sendo assassinados no Sudão, no Vietnã, na Coréia do Norte e na China é cem vezes maior do que a quantidade de vítimas civis da Guerra do Iraque, e a mídia chique inteira, incluindo este jornal, não diz uma palavra contra isso. Nem noticia. Ao mesmo tempo, leis draconianas para suprimir a liberdade de expressão religiosa são adotadas na Europa e nos EUA, mas jamais aplicadas aos muçulmanos locais. É esse o "Ocidente" que se pretende defender contra o Islã? Tudo isso é de uma falsidade monstruosa. Não há uma guerra de civilizações, mas duas guerras superpostas, uma do Islã contra o globalismo ocidental, outra de ambos (e da esquerda internacional) contra a civilização judaico-cristã.

FOLHA - E quanto ao papa?
CARVALHO -
O discurso em Regensburg, não foi sobre o Islã. Este foi mencionado como gancho para a questão central, que era a necessidade de uma teologia racional, já mil vezes reiterada pela Igreja. As afirmações do imperador Manuel 2º, o Paleólogo, citadas no discurso foram três: 1) O Islã adotou a violência como método legítimo de conversão. 2) Essa foi a única novidade religiosa trazida pelo Islã. 3) Converter por meio da violência é errado: a conversão deve-se alcançar por meio da persuasão racional.
A terceira afirmativa é analisada extensamente no restante do discurso. As duas primeiras foram citadas de passagem só para mostrar o contexto histórico da discussão e em seguida deixadas de lado. Ao concentrar seus ataques numa delas, os críticos muçulmanos e os não-muçulmanos anticristãos mostraram incapacidade ou falta de disposição de distinguir entre a menção casual à fala de um terceiro e a opinião formalmente expressa do orador. São burros, desonestos ou ambas as coisas.
Mas o papa também não foi muito hábil nas explicações que deu para acalmar os nervosinhos. Ao dizer que a citação de Manuel 2º não expressa sua opinião pessoal, ele deixou uma perigosa ambigüidade no ar, pois as três asserções formais contidas nessa citação são totalmente independentes entre si, e não é possível que Bento 16 concorde ou discorde das três uniformemente.
A primeira é simples expressão de um fato universalmente reconhecido, e o papa, mesmo que não estivesse interessado em tomá-la como tema do seu discurso, como de fato não tomou, não poderia discordar dela de maneira alguma.
A segunda, na mesma medida, é totalmente falsa. O Islã trouxe uma infinidade de inovações, entre as quais a mais espetacular de todas é ser o primeiro e único direito penal religioso destinado a aplicar-se à humanidade inteira e não só a uma nação em particular. Isso constitui a diferença específica do Islã, e sem isso a sua pretensão de ser uma revelação nova e autônoma perderia o seu argumento mais forte.
A terceira é o simples resumo de uma doutrina tradicional da Igreja, e o papa não poderia discordar dela. Em suma, Bento 16 só pode e aliás deve estar em discordância com Manuel 2º quanto à segunda afirmação, um erro histórico perdoável na Idade Média, mas que hoje em dia seria intolerável mesmo num estudante. O único ponto do discurso papal que poderia ferir a honra dos muçulmanos é um erro que o orador não endossou nem poderia ter endossado, sendo o erudito que é.